quinta-feira, 23 de outubro de 2014

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Fotografia de Amândio Sousa Vieira in Ponte de Lima Outros tempos: 1858-1949




O foco deste projeto será a Torre da Porta Nova, mais conhecida como ‘Torre da Cadeia Velha’ de Ponte de Lima, vila pertencente ao distrito de Viana do Castelo, em Portugal. Esta cadeia integra o pouco que resta das muralhas de defesa criadas no ano de 1511, no reinado de D. Manuel I, para proteger a vila ‘mais antiga de Portugal’.

Desta forma, o enquadramento deste projeto poderá ser, numa primeira fase, o levantamento de memórias, seja através dos depoimentos e histó­rias contadas pelos locais, bem como fotografias e vídeos existentes sobre o local.
Esta perspetiva de investigação segue a linha de pensamento de Oxford no centro de ‘Life Writing’, no sentido de recuperar e registar para memória futura, histórias, lendas e imagens que de outra forma seriam esquecidas, por se tratarem de indivíduos sem realce manifesto.

Segundo Alexandra Esteves “a primeira cadeia de Ponte de Lima, situava-se junto ao Paço do Visconde, designada como ‘cadeia do castelo’ ou ‘Alcantaria’. Con­siderada pequena para receber todos os presos de correição da comarca de Entre Douro e Minho, o rei D. Manuel I mandou construir uma nova cadeia, que ficou concluída em 1511. Tratava-se de uma torre acastelada, de planta quadrangular, divida em três pisos, com duas janelas gradeadas sobrepos­tas voltadas para o rio Lima e outras duas na face da torre”.

A Torre da ‘Cadeia Velha’ foi, tal como o nome indica, um espaço de encar­ceramento até à década de sessenta do século passado e posteriormente funcionou como Arquivo Histórico e Municipal.

Com a recente recuperação, ficou dedicada a galeria de exposições, lança­mento de livros e atualmente, funciona como Loja Interativa de Turismo. Trata-se de um espaço de realce, situado no passeio 25 de abril em pleno Centro Histórico, muito procurado pelos turistas e curiosos.

“Esta cadeia albergou, em média, 23 presos, entre 1732-1739, sendo de­signada “cadeia do meio” [segundo piso] a que comportava maior número. Neste período, a alimentação e o vestuário dos encarcerados eram supor­tados pelos próprios” (Esteves, 2005).

Para além do seu interesse arquitetónico, é importante realçar o papel da cadeia como espaço de correção com finalidade repressiva e para regene­rar o individuo em termos morais, tendo em vista a sua reinserção na so­ciedade.

“Se a prisão, enquanto fórmula de gerir a delinquência e o crime, consti­tuiu ao longo do século XIX () um amplo tema de debate, ela foi depois (convenientemente) ignorada por longo tempo, apesar de terem falhado, entretanto, todos os projetos em redor da sua capacidade punitiva/regene­radora, em que o século XIX depositara as maiores esperanças. (...) Os pro­blemas, «esquecidos» durante anos a fio, expuseram-se então aos olhos de todos: violência, sobrelotação, falta de trabalho, punições cruéis, má alimentação duplicavam as penas dos detidos, enquanto do outro lado da barricada os guardas se queixavam de falta de segurança e baixas remune­rações” (Santos, 1999).

Após alguma pesquisa sobre a cadeia e de algumas visitas ao local foram identificados os principais problemas aos quais este projeto se propõe so­lucionar. Nomeadamente o facto de o edifício ter quatro andares, em que dois deles são ocupados pela Loja Interativa de Turismo, enquanto os ou­tros dois pisos superiores são visitáveis mas estão vazios e desativados. As­sim, identifica-se um potencial patrimonial menosprezado.

Também foi possível identificar que acesso a fontes informativas será limi­tado, no que toca às entrevistas a ex-prisioneiros e ex-guardas da cadeia (que poderão não estar vivos ou inábeis para entrevista).

Por último constatou-se que existem poucos registos imagéticos da cadeia e do seu funcionamento, pelo que será de interesse utilizar a imagem, tan­to estática como em movimento, para registar testemunhos sobre o funcio­namento da cadeia até meados dos anos 60 (década em que a cadeia deixou de estar ativa).

A investigação permite a inclusão de determinadas construções críticas (teorias ou ideias relativas ao funcionamento do mundo). Deste modo, os principais propósitos deste projeto são: compreender as várias funções e vocações históricas da condição de aprisionamento; estudar o papel das cadeias para a sociedade, criminologia e arte; e refletir sobre a natureza intrínseca de “cadeia”, bem como o contraste entre esta natureza e a dos espaços contemporâneos (herméticos, invisíveis) de prisão.

“As imagens estão inextricavelmente entrelaçadas com nossas identidades pessoais, narrativas, estilos de vida, culturas e sociedades, bem como com as definições de história, de espaço e da verdade” (Pink, 2001).


Fontes:

ESTEVES, Alexandra - A morada indesejada: os presos da cadeia de Ponte de Lima (1732-1739). Ponte de Lima: Liga dos Amigos do Hospital, 2005. ISBN: 9729060916.

ESTEVES, Alexandra - As prisões do Alto Minho no século XIX: A ação das Misericórdias. In Misericórdia de Braga. 2011. Nº 7, p. 45-62.

ESTEVES, Alexandra - Da caridade à filantropia: o auxílio aos presos po­bres da cadeia de Ponte de Lima no século XIX. In Estudios Humanísticos. 2008. ISSN 1696-0300. Nº 7, p.221-236.

PINK, Sarah - Doing visual ethnography: images, media and representa­tion in research. London: SAGE, 2001.

SANTOS, Maria – A Sombra e a Luz: As prisões do Liberalismo. Porto: Edi­ções Afrontamento, 1999. ISBN 972-36-0485-X.